26.11.07

MINHA FAMÍLIA WALTON

Sou filha de uma família desestruturada, por motivos diversos e circunstâncias adversas todos, individualmente ou como família, desenvolveram algum grau de insanidade, Nelson Rodrigues estaria à vontade lá em casa. Basta dizer que, às tantas, o primogênito se exilou na floresta amazônica, num sonho de Fitzcarraldo, a caçula casou-se aos 14 com homem de 64 e morreu menina, de um câncer alimentado com pílulas homeopáticas e eu, a filha do meio, procurei - e por pura sorte encontrei - um príncipe encantado que me salvasse num cavalo branco. Sobrevivi no refúgio de um útero cercado pelas montanhas de Minas, como bem definiu Gonzaguinha, chegamos finalmente ao tema central deste post. Quando cheguei por aqui eu nada entendi, como na música sobre um baiano chegando a Sampa, no meu caso a paulista chegando à capital mineira se confrontava com uma vida cultural insípida e insipiente, lembro que demorei um ano para voltar ao cinema, já tinha assistido a todas as estréias. Beagá não tinha as vantagens da cidade grande, mas tinha várias desvantagens da cidade pequena! Com todos dando conta da vida alheia, viver aqui era como estar de passagem pelo inferno. Talvez por isso mesmo, só um analista pra entender, o que mais me encantou na nova cidade foi conhecer o velho modelo "família Walton", não confundir com a família de Sam Walton, considerada a mais rica do mundo e dona da rede Walt-Mart, estou falando do antigo seriado da TV: o pai na cabeceira, a mulher, a avó, oito filhos à mesa, isso no café, no almoço e no jantar. Pra começar, não sabia que ainda existiam famílias tão numerosas, minha realidade já era a dos casais com um ou dois filhos, no máximo três. E nem sabia que era possível reunir todos assim, à volta da enorme mesa, tantas vezes ao dia. No começo da minha adolescência os almoços em casa eram quase impossíveis, comia-se qualquer coisa na rua entre a escola e uma infinidade de afazeres à tarde, café da manhã e jantar era cada um por si e a qualquer hora, nossos encontros se resumiam a alguns esbarrões na porta da geladeira. Quando vivi a balbúrdia e a alegria à volta da mesa, a turba falando ao mesmo tempo para por os assuntos em dia e compartilhar sucessos e fracassos, todos se metendo na vida de todos - mas aceitando verdadeiramente a recíproca, tudo isso me deixou fascinada, parecia que eu estava participando ao vivo do seriado: boa noite John Boy, boa noite Mary Ellen! Você agora está rindo, ou sorrindo aquele esgar meio irônico, bem sei que tem mesmo um lado detestável no modelo The Waltons, mas devo dizer que foi assim, na prática, que aprendi o significado de família, essa palavra gasta e fora de moda, instituição cheia de vícios e de defeitos, mas que pode ser, também, um porto seguro - sobretudo depois que seu próprio navio familiar naufraga... Passados mais de 30 anos desde que por aqui cheguei, sei o melhor de ter ficado por aqui – além, claro, do fato de a cidade ter hoje as vantagens da metrópole e o melhor da cidade pequena, a começar por ser ainda possível almoçar em casa! Conseguimos, nós também, construir um porto, é verdade que nem sempre perfeitamente seguro, em que sempre podem se ancorar irmãos, filhos, namorados e namoradas, netos, amigos e até amigos dos amigos.

11 comentários:

Anônimo disse...

Ah bom, agora entendi... a mineira convertida estava trabalhando em silêncio...

Muito bom post, prá variar. Discordo um pouco, também prá variar: acho que temos as desvantagens da metrópole e perdemos as vantagens de roça.

Mas o que mais me impressiona nessa estória (também história) é a redução abrupta do tamanho das famílias e, de certa forma, de seu valor, em geral. Sou o sexto e último filho de família de uma época (40 anos atrás) em que a fertlidade média das mulheres era de exatos 6 filhos.

Éramos seis, e esses seis geraram dez netos aos nossos pais, vale dizer, a média caiu para pouco mais de um filho e meio (o meu vale por pelo menos dois) por família, aquelas que se mantiveram...

Sem falar nas tradições, valores, hábitos, cultura que foram se perdendo... Outros as acharam, que bom...

Anônimo disse...

Ei, RM!

Sim, as desvantagens da cidade grande (o trânsito anda infernal) e as desvantagens da cidade pequena (e seus provincianismos).
Mas acho que nessa altura já me aquietei. rsrs
E consigo ver também um outro lado, que me recusava a ver, o das vantagens da cidade grande e o das vantagens da pequena...

Realmente os núcleos familiares vão se reduzindo. Minha bisavó paterna gostava de enumerar: 16 filhos (coitada!), 56 netos, 106 bisnetos, 6 tataranetos. Tataranetos depois pintaram dezenas, mas ela não conheceu. Vovó adorava essa coincidência de números 6, mas repare que entre netos e bisnetos o número nem dobrou, média de menos de 2 filhos pra cada...

Tive 3 filhos (e 7 vezes fiquei grávida, perdi 4, todos são linfos porque faço rascunho rsrs) e foi muito pra minha geração. As mulheres da minha idade, da sua idade, tiveram filhos bem mais tarde e não passaram dos dois, né?

Vão surgindo novos valores, novas formas de ser família. Só espero que esse movimento não aumente a direção ao EU, de que falamos lá no Dom Caixote, a respeito da juventude.

Beijos e boa noite!

Anônimo disse...

Nossa, Luciana!

Fiquei pensando porque será que passo sempre aqui. É porque você escreve sobre coisas da nossa vida e vai ajudando agente a entender as mudanças. E uma delas é essa, a família.

Tenho apenas uma irmã, sou das famílias pequenas. Quando era criança pelo menos o Natal era grande, todos os primos na casa dos avós. Agora que minha avó ficou viúva, cada ano vai na casa de um filho (são apenas 3) e pouca gente se reúne, cada filho fica com sua família. O Natal vai chegando e fiquei já com saudade da farra que era quando eu era criança.

Um beijo,

Cláudia

Anônimo disse...

Ei, Lu!

Posso dar idéia para um texto? Não posso? Vou dar assim mesmo, aproveita se quiser, não vou cobrar nada rsrs: homens e mulheres descasados. Ou alguma coisa a ver com EX.

Beijos

Rafael

mlupedrosa disse...

Lu,
Essa doença do EU vem minando essa coisa gostosa (com exceções, claro!) que é a família. Durante alguns anos da adolescência, casa para mim era igual hotel e lavanderia. Passou essa fase, mas ainda algumas características do EU ainda persistem. Outro dia cheguei em casa e tava minha mãe tecendo um cachecol e meu pai lendo jornal ao lado dela e eu tive certeza que não queria mais nada naquele dia, bastava ficar contemplando os dois... são coisas tão lindas que a gente nem vê direito!
Belo post, bjo, ML

Anônimo disse...

Oi!

Família pra mim (sobretudo meus encontros gastroetílicos em que engordo 2 kilos rsrsrs) é coisa fundamental.

Eu também assistia à família Walton! Era pequena, mas achava super legal. Eu era fã do John Boy, claro!

Faço o possível por manter esse clima de família aqui em casa. Mesmo sendo eu, minha filha e a empregada, somos uma família. E compareço a todos os eventos familiares, mesmo os que sei que serão chatinhos. Quero que minha filha sinta o aconchego.

Bom tema!
beijoca,
Clarice

Anônimo disse...

Prá mim a Clarice é a campeã de gozação desse blog. Primeiro foi aquela dos cachorros gordos, agora a família integrada por mim (ela), a filha e a empregada... rsrsrs

Não tem cachorro não, Clarice?

Anônimo disse...

Ei Luciana,

Terceira ou quarta vez hoje, viu como eu gosto de você?

Aqui, agora é prá avisar que já arrumei nova confusão, dessa feita com o irmão do MR, um cara que está em todos os jornais hoje, dando opiniões (respeitáveis) sobre educação e pedagogia.

Dei duas caneladas no coitado e se ele topar a "briga" tô fodido, entendo porra nenhuma desses assuntos.

Me dê uma mão (rs) lá?

Anônimo disse...

Tenho saudade daqueles Natais ou festas de família onde reuniam-se filhos, filhos dos filhos e alguns filhos dos filhos dos filhos... quando minha avó era viva... bons tempos. Com confusões ou risadas tudo sempre era fantástico! Minha mãe foi econômica e teve apenas duas... ou seja, já ficamos uma família pequena. Nada daquele tempero italiano de outrora!
Hoje, cada um tomou seu rumo... alguns já se foram... cada um formou sua própria família... outros já desfizeram (em parte rs) suas famílias (meu caso rs)... Me vejo numa situação parecida com a da Clarice: 2 filhos, 4 gatos (Negra Lee, Febem, Gaby e Andy) e 1 cadela (Madonna a insuportável que deveria ter um livro só dela parecido com Marley e Eu rs)!

bjos

ps> LG, acho que a idéia do Rafael é bem interessante... Garanto que a confraria (adorei a forma como denominou seus comentaristas) teria muito a dizer!! hehe

Anônimo disse...

Ei, gente!

1 - Clarice, RM tem razão, esta foi demais: família formada por você, a filha e a empregada! Mas sei direitinho o que você quer dizer. São novas formas de famílias, tendo afeto é o que vale!

2 - Rafael, pode dar idéia sim, você já deu algumas, lembra? Já foi até citado em post rsrsrs.
Vou tentar, não faltam amigas e amigos descasados pra me ajudarem com a pauta. Vou experimentar mais uma pesquisa "quali". Em breve.

3 - Marilu (by RM), esse tema do EU rende bastante, você deve mesmo debater o assunto lá no Dom Caixote. Acho que meio pensando nisso que escrevi sobre a família Walton, sei lá... Nesse tipo de família o que é sufocante é exatamente a falta de espaço pro EU. Mas como estamos cada vez mais individualistas e consumistas, essa barreira ao EU faz até bem, pra equilibrar as coisas e recuperar o terreno do afeto, né?

4 - RM, entraste em confusão das brabas! rsrsrs De educação em casa sei apenas que a gente procura não copiar os erros dos pais, mas inventa uns erros novos, a capacidade humana de errar é impressionante! rsrs
E de educação na escola sei apenas que as crianças podem ser muito felizes no jardim, gostar da primeira metade do ciclo fundamental, mas vão ficando infelizes na segunda metade e chegam a cair em depressão por causa do ensino médio... Só recuperam alguma alegria na universidade. Vou lá dar pitaco, claro, aguardo os posts.


5 - Leitora! Ainda bem que és assídua! Vai chegando dezembro e vamos ficando nostálgicos, né? rsrsrs
Sabe o que faço aqui em casa na noite do dia 24, há mais de 20 anos? Faço o "Natal dos Desgarrados", junto parentes e amigos que não têm ceia marcada, ou família longe, o que for. Sem troca de presentes ou coisa parecida, nos reunimos para um jantar com frutos do mar ou experiências culinárias, vale qualquer coisa que seja genial que não lembre peru! rsrsrs Experimente!

Beijos a todos!!

Marcos Rocha disse...

Oi, LG:

Tô chegando atrasado, porque estava viajando pra sua/nossa terrinha que vai muito bem, obrigado!

Também gostei do post, embora nunca tenha visto "Os Waltons". Mas participo de uma família numerosa que, com o tempo, está diminuindo de tamanho.

E já fiz parte de uma família paulista de origem italiana, em tudo semelhante à que você descreveu.

Acho que o conceito de família ideal é exatamente esse: agrupamento de pessoas que tenham laços de sangue (ou não), mas com muito afeto e muita solidariedade uns para com os outros, apoio mútuo nos bons e maus momentos sem exigir nada em troca, enfim, laços fortes de amizade e de fraternidade.

Infelizmente, como seu post constata, está cada vez mais difícil encontrar famílias com essas características.

Abração do

MR
28/11 - 15:45